segunda-feira, 26 de julho de 2010

crowd

1. Sun of the beach
Esta imagem, captada no Cantinho durante o último domingo, demonstra bem o mal que o sol faz às pessoas, obrigando-as a viver sob uma pesada taxa de compressão, como se fossem dados digitais, que ao final do dia são remetidos à sua origem e entopem tudo, como a estrada do Baleal para Peniche, já carecida há muito tempo de largura de banda.
A culpa, claro, é do sol, esse verdadeiro sun of the beach que parece querer, de vez em quando, demonstrar falaciosamente aos veraneantes acabados de chegar que, afinal, é tão algarvio o nosso Oeste como a Quarteira ou Portimão.
Só é pena a água ser um bocado fria, n'é Maria? E ontem que 'tava um dia tão bom, Maria! E hoje um vento do caraças, Maria! E anda um gajo aqui encasacado enquanto eles dizem na televisão que o país está a arder com 40 graus, Maria! E olha-me esta neblina, Maria! E vamos embora, Maria! E mil euros por um apartamento na ilha durante uma semana, Maria! E, para o ano, vamos mas é outra vez para a Quarteira, Maria! E nunca mais nos apanham cá, Maria!

2. O Pistoleiro do Oeste
Enquanto a taxa de compressão à beira-mar é o handicap dos banhistas - que não interessa, aqui, resolver -, no que respeita às ondas, já está na hora de implementar um sistema justo, tipo funil, como o que existe para controlar o fluxo de tráfego em situações de confluência elevada, e que consiste em suprimir faseadamente as faixas de rodagem até ficar só uma, como na Ponte 25 de Abril.
Se fizessem isso, terminariam os choques e as amolgadelas; os impropérios e a atitude hollywoodesca de eliminar os outros como os cowboys fazem aos índios.
Reparem bem na fotografia (cliquem em cima para ampliar): que pistoleiro de calções se desembaraça airosamente dos comanches que o assaltam (no total, uma dezena - três pela frente e sete pelas costas!)?
Enquanto os índios ainda puxam pelas armas, já ele dispara! E quem quiser que enterre os mortos! Pelo menos, há-de continuar a ser assim enquanto não vier por aí um xerife com a lei do funil. Não é, Saraiva?

sexta-feira, 23 de julho de 2010

teenage

Imagino o pessoal do Cantinho a surfar com esta idade...

quarta-feira, 21 de julho de 2010

selvagens

Pena não haver uma pensão social ou um rendimento de reeintegração social para este tipo de tribo...

segunda-feira, 19 de julho de 2010

no rasto de Sibel

Há dias, enquanto remexia numas coisas velhas, daquelas que se costumam guardar nos báus dos sotãos, tropecei num álbum de selos de cuja existência já nem me lembrava. Rapidamente me veio à memória o dia do meu 14º. aniversário, em que recebi como presente da minha mãe, a pedido meu, o dito objecto. Não sei o que me terá, alguma vez, passado pela cabeça para coleccionar selos. Talvez porque, então, todos os jovens de 14 anos tinham obrigatoriamente de coleccionar qualquer coisa, sob pena de não serem considerados normais.
Ao folheá-lo, fui surprendido, entre as estampilhas turcas, com a fotografia de Sibel, uma bifa incomum que conheci na Caparica, em Agosto de ’87, e que, desde então, nunca mais vi.
Naquela altura, eu e o meu amigo Zé Carrilho passávamos os fins-de-semana e as férias emigrados na Costa, com os nossos chaços amarelos a cheirar a coco. Num sábado quente, vimos passar no paredão da Praia Nova a nossa antiga colega de escola Urinapacova, a quem chamávamos assim por causa do seu aspecto siberiano. Apesar de loura, a Urina – que odiava a alcunha, sobretudo na forma abreviada – não era uma miúda muito simpática nem gira e, por isso, tê-la-íamos deixado seguir em paz o seu caminho, não fosse o facto de se fazer acompanhar de uma bela morena que nos despertou imediatamente o apetite.
O Zé Carrilho, que tinha os dentes tortos e manchados por carência de flúor, mas que era um tipo cheio de lábia, não perdeu tempo. Em menos de nada, a Urinapacova e a sua amiga de origem turca estavam a comer uvas connosco na praia. O Zé Carrilho esqueceu-se logo das ondas e ficou para ali num intercâmbio de línguas, enquanto eu me pisguei com a prancha debaixo do braço, para não levar com a Urina, que era viciada em jogos de cartas e já se preparava para me engatar com uma partida de bisca.
Sibel era natural de Istambul, cujo pai, cardiologista de profissão, tal como o de Urina, tinha vindo a uma conferência em Lisboa e ficara alojado na vivenda que os pais desta possuíam na Caparica. Conhecer Sibel teve, para mim, um certo glamour, pois turcas, até essa data, eu só conhecia as toalhas de banho lá de casa.
Nessa noite, eu e o Zé Carrilho esperámos por elas no Saltarico, enquanto fumávamos e bebíamos sangrias.
- Vou tentar convencê-las a irmos para casa da Urina. A Sibel disse-me que os pais iam para o Casino Estoril – largou, piscando-me o olho.
- Pois, tu ficas com a Sibel e eu tenho de gramar com a Urina!...
- Sempre podes entreter-te a jogar à bisca...
Assim que elas apareceram, fomos para uma esplanada na rua dos Pescadores beber cervejas e foi aí que descobri o encanto de Sibel, algo que o Zé Carrilho parecia teimar em restringir às suas pernas sedosas e bem desenhadas. Era simpática e espantosamente comunicativa e culta. Com os seus olhos semicerrados, tipo Lauren Bacall, falou-nos da Trácia e da Anatólia; da confluente Istambul, atravessada pelo Bósforo, que tinha, como o Tejo, uma ponte alta e bela.
Não chegámos a ir para casa da Urina. Perdemo-nos na noite dos bares e das discotecas, onde vi, com alguma inveja, a deslumbrante Sibel ceder aos encantos do Zé Carrilho e partilhar com ele o hálito da pastilha “Gorila” de mentol que eu lhe tinha oferecido.
Ao fim de uns dias, Sibel regressou à antiga capital do império otomano, deixando-me uma das fotografias que eu próprio lhe tirara no pontão do CDS com a sua Kodak e a promessa de me escrever em breve. Não sei o que foi feito da carta mas ainda conservo os selos.
Em 2001, tive uma passagem meteórica pelo sudoeste turco. Os taxistas que se apinhavam no porto de Kusadasi para disputarem os turistas com os seus bigodes austeros eram um rasto muito vago de Sibel. Então, como hoje, lembro-me bem de ter pensado: para onde terão ido as suas belas pernas?

segunda-feira, 12 de julho de 2010

a relíquia

Quando um objecto começa a ser considerado uma peça de museu, significa que perdeu a função para a qual foi inicialmente concebido. Numa certa perspectiva, deixa de ser um utensílio para se transformar num "inutensílio".
Bem poderia ser este o caso da relíquia que se vê na foto. Mas não. Adquirida há 26 anos pelo João, esta Seven, que já foi um dia branca como a espuma das ondas, retomou entretanto os seus tempos de glória e serve hoje à Carolina (na imagem, à direita) para ir seguindo os passos do pai.
Deparar com elas (a prancha e a herdeira) dentro de água, entre um crowd massivamente formatado, é tão estranho como ver um jovem recém encartado a conduzir um clássico de mil novecentos e troca o passo. Um paradoxo inesperado, certamente indiscreto, mas sobretudo encantador.
A nossa Té, verdadeira lenda viva do surf português, que trata as pranchas por tu há mais de trinta anos, também não ficou indiferente ao tesouro. Se fosse dela, talvez não se atrevesse a interromper-lhe o sono profundo e o conservasse religiosamente em paz, como se faz aos "inutensílios" de culto, tipo cartas de amor – fiquem a saber que ela ainda guarda a single fin com o buda indiano pintado que lhe ateou a paixão!
Quanto à nossa Carolina, que ainda não tem idade para nostalgias, vai tratando de emprestar à relíquia uma vida extra, ressustidando-a como utensílio e acrescentando-lhe imperiosamente uma nova história. Por imposição natural do seu crescimento desportivo, deixá-la-á a seu tempo. Mas apostamos mil ondas em como saberá mantê-la, algures, ao alcance dos olhos. Como faz a Té, zelosamente, com o buda indiano. Não há amor como o primeiro!...

sexta-feira, 9 de julho de 2010

novas oportunidades

Quando lhe perguntavam o que queria ser quando fosse grande, Joaquim respondia duplamente: «quero ser músico e dançarino!».
Nem uma coisa nem outra.
Joaquim ingressou no escritório duma empresa privada quando lhe nasceram os primeiros pelos da barba. Começou por fazer recados simples e transformou-se, com o tempo, num dedicado contabilista. Sentou-se durante quarenta anos na mesma cadeira e lambeu o dedo indicador um milhão de vezes, até ao dia em que o chamaram ao gabinete da administração e lhe fizeram as contas.
Crise económica para aqui, crise económica para acolá, você foi sempre um óptimo funcionário, e tal, mas as dívidas aos fornecedores e a escalada do I.V.A. não nos deixam alternativa. Boa sorte, Joaquim!
No dia seguinte, o nosso Joaquim tirou uma senha no Instituto do Emprego para comer tremoços durante um ano e fazer palavras cruzadas. Até ao dia em que tomou conhecimento de que o seu dentista tinha abraçado o ofício depois de deixar a pastelaria onde trabalhara durante mais de vinte anos! Feita por ele, a prótese dentária que Joaquim usava desde o último Natal tinha a chancela do Programa Novas Oportunidades. Ora, se o doutor Bastos tinha conseguido trocar as bicas e as bolas de berlim pela bata branca, por que não haveria o nosso Joaquim de conseguir no futuro a carreira artística com que sempre sonhara? A visão catastrofista com que saíra da Teixeira & Gomes naquele dia fatídico era uma névoa que morria agora benevolamente debaixo do sol.
Joaquim penteou-se muito bem penteado e correu para as Novas Oportunidades, orgulhoso, como o doutor Bastos, por contribuir para a recuperação do atraso português em relação aos países da União Europeia e da OCDE. «Eu, Joaquim Jesus da Conceição, aluno de música e de dança do Conservatório Nacional!», pensou, inchado, enquanto ajeitava os colarinhos e aguardava ansiosamente a sua vez. Mas, apesar de saber dançar tão bem como o Baryshnikov e de tocar marimbas e berimbau, Joaquim esbarrou no numerus clausus. A senhora da secretaria das Novas Oportunidades confortou-o com a ideia de que os artistas eram todos homossexuais e dependentes da cocaína, e aconselhou-lhe um curso digno, com garantia de emprego e impacto directo nas listas oficiais do Instituto Nacional de Estatística.
- Eu, instrutor de surf? – Espantou-se Joaquim.
- Vai ver que não se arrepende! Pelo menos, não dá trabalho nenhum!
Joaquim fez o curso.
Foi colocado na Escola de Surf do Rio Zêzere, onde aguarda todos os dias pacientemente pelos alunos que não tem.

Fonte da imagem: South Coast Alaia & Bellyboard Society

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Aquecimento à maneira!




- Ó Pata, onde pensas que vais?
- Vou apanhar umas ondinhas, tá metrão e meio com alta parede!
- Então e o aquecimento??
- Já fiz, ali com o teu pai...
- Sim, sim... Esse aquecimento do levantamento de copos é bom mas é para a janta. Anda cá que eu mostro como se faz!
- Bem, tu és pró, Carlota!
- Como vês, o aquecimento é tão eficiente que qual neoprene qual quê...
- Eh pá, isto é fixe, as minhas ancas até já rodam como nunca antes!
- Então tás pronto a entrar no mar. Mas olha, levo a prancha do meu pai, que é bué grande!
- O teu pai é bué grande?
- Não, ó caramelo, a prancha! Por isso pensa bem antes de me dropinares, olha que te passo com os fins em cima do lombo...
- Dropi quê???
- Isso, faz-te desentendido... Depois não te queixes!

domingo, 4 de julho de 2010

ai destino

- Eu não acredito! És mesmo tu, Toni?!
- Em carne e osso, queridas!
- Que fazes no Cantinho? Também és surfista?
- Não, graças a Deus. Mas fui convidado para actuar no Bar da Praia logo à noite.
- A sério?! Mas isso é o máximo! Desde os tempos da faculdade que sonho assistir a um concerto teu!
- E por que nunca o fizeste?
- Tenho tido azar... Coincidem sempre com as minhas aulas de forró e kuduro!
- E tu, morena? Também és minha fã?
- Fã?! Deixa-me rir, pá! Se eu tivesse tantas moedas de 5 cêntimos como as vezes que tenho de mudar a porcaria do rádio por causa do “Ai Destino” e outras que tais, era mais rica do que a Oprah Winfrey!...
- Quem?
- Oprah Winfrey! Se dissesse Júlia Pinheiro, já conhecias, não?
- Deixa, Toni. A minha amiga é mesmo assim, um bocado azeda... Mas é boa pessoa!
- Estou a ver... Isso é falta de love, querida! – amour, liebe!
- Falta de quê, pá?! Repete lá isso! Estou desconfiada de que não sais daqui sem comeres areia...
- Desculpa, Toni, importas-te que eu tenha uma conversa à parte com a minha amiga?
- Com certeza, coração. Se não a conseguires amansar, posso chamar o Mikael, que é mais para a idade dela.
- Ouve lá, tu estás parva ou quê? Que ideia é essa de gozares com o homem?
- Não tenho paciência para Júlios Iglesias da Pampilhosa da Serra...
- O.K., mas não precisas de ser grosseira!
- É um bimbo, pá!
- Bimbo, não! Tem músicas bem originais!
- Cala-te! Já foi mais do que uma vez acusado de plágio!
- Isso não interessa! É giro e famoso, e eu vou convidá-lo para vir jantar connosco!
- Ai é?! Então, bom proveito! Eu vou mas é para casa comer o resto do brioche e ver o “Soltem a Parede”.
- Vai! Tu é que perdes...
Desculpa, Tonizinho, mas a minha amiga foi-se embora, porque estava um bocadinho mal disposta. Quanto a mim, estou cheia de fome. Que tal se fôssemos comer um bitoque, ou assim, e depois jogássemos à lerpa?
- À lerpa?! Que ideia! Nem sei jogar à lerpa!
- Óptimo! Fazemos um acordo: se eu ganhar, deixas-me dançar e cantar no teu coro logo à noite!

sexta-feira, 2 de julho de 2010

the sailorman

- Popeye, querido, estava farta de andar à tua procura! Onde é que te meteste?
- Quê, pá?!
- Vá, não disfarces. Anda dançar comigo.
- Olha esta agora!... Não te conheço de lado nenhum, pá!
- Bolas, Popeye, não me digas que o Brutus te bateu outra vez na cabeça e te provocou amnésia!
- Ó, ó, ó! Alto aí! Se alguém, aqui, dá murros a alguém sou eu! Vá, vai mas é para casa lavar a loiça!
- Sim, mas...
- ANDEX!
- Chiça, nunca te vi tão bravo! Deve ser dos espinafres líquidos que vêm dentro dessa garrafa castanha, não?
- VAI LAVAR A LOIÇA, JÁ TE DISSE!!!
- Uau, que duro que ele está! Ainda gostas de mim, amor?
- Eh, pá, podes-me deixar em paz? Ou preciso de te enrolar um chop ao pescoço?
- O que é um chop, querido? Um cachecol de vison?
- Deixa-me acabar de beber esta bujeca, que eu já te dou o vison! Tenho ali na mala do carro um fio de nylon que é mem’ bom para te atar os pulsos e os artelhos. Com o teu peso de codorniz, vais dar um belo papagaio para eu me entreter quando estiver vento e não houver ondas...
- És tão maroto, Popeye! Adoro as tuas brincadeiras sexuais!