terça-feira, 29 de junho de 2010

regresso ao futuro

Foi como se avistássemos o Willy Fog. Não nos chegavam novas dele há mais de oitenta dias, desde que partira para uma aventura intelectual que Portugal há-de valorizar oportunamente, quando for ministro da educação (para já, não pode, pois não aceitam lá em S. Bento manuéis guedelhudos).
Estacionou a Ford Transit de estimação e tirou lá de dentro os restos mortais do Bom Petisco, do feijão encarnado e de todas as coisas enlatadas, empacotadas e engarrafadas que lhe forraram o estômago durante mais de oitenta dias. Empurrou tudo pela boca do ecoponto, até este ficar mal disposto. Fixou-nos, depois, abananado como um doente que acaba de sair do hospital. Cambaleou até nós e veio queixar-se copiosamente da branquidão e da abstinência. Era um homem morto. Atirar ao mar aquele corpo era um dever. Uma coisa urgente. Vestimos um fato solidário e atirámo-nos com ele.

Foto: Carla

segunda-feira, 28 de junho de 2010

publicidade

Para quem não se apercebeu, houve este fim-de-semana no Cantinho uma sessão fotográfica com o fim de promover a nova colecção de óculos de sol da Von Zipper. Aqui fica a imagem de dois modelos da nova linha.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

o engenho do artista

O futebol é o ópio do povo e a África do Sul não tem dado tréguas a ninguém nos últimos dias, procurando satisfazer-nos com a maior dose de bola que é possível consumir em quatro semanas.
Os media, claro, dão no produto até queimarem os dedos. No caso das televisões, as ferramentas de que dispõem, hoje, para analisar os aspectos do jogo, são de tal modo polivalentes e evoluídas que transformaram já os comentadores desportivos em perfeitos médicos legais, com uma habilidade para dissecar absolutamente enciclopédica, graças, em muito, aos modernos bisturis virtuais e às autópsias que se podem realizar com eles.
Pela parte que me toca, já vomito esse rebéu-béu. Gosto é de ver as bolas a entrar na baliza e posso garantir-vos que, se mandasse na FIFA, aboliria categoricamente a lei do off-side, para permitir que os avançados jogassem à mama, como no futebol de rua.
Já devem estar a pensar “mas que raio de conversa!” e a desconfiar de que algo estará errado: ou o texto ou as fotos.
Pois, nem uma coisa nem outra. É que, depois de ter contemplado as imagens que fiz há uns dias do fabuloso Diogo Gonçalves, concluí o jeito que me dariam aqui o grande Rui Santos e o José Eduardo e o Freitas Lobo e o Querido Manha e outros doutores legais do desporto, para me ajudarem a mastigar aquela finta magistral. Que movessem o rato sobre as imagens para debaterem, step-by-step, como fazem com o Messi e com o Ronaldo, a questão do génio. E assinalassem, com uma bolinha amarela, o auge do “lance”. E sustentassem o seu sábio discurso numa centena de repetições em super slow motion. E esmiuçassem os ângulos. E esmiuçassem outra vez os ângulos. E dissessem tudo. E nada deixassem por dizer. E de tal modo bem dito e tão bem explicado que, no dia seguinte, me fosse impossível não decalcar, em cada onda, com total precisão, o engenho do artista. Dava-me cá um jeitaço!

domingo, 20 de junho de 2010

crime e castigo

- Isto é esquisito, pá! Estou a ver ondas a quebrar na Berlenga!
- Hã?!
- A sério, vê-se bem a espuma!
- Não sejas parvo, pá! Estás a apontar para o cabelo do velhinho aí à frente!...
- Ó pai, diz aqui nas notícias do telemóvel que morreu o José Saramago!
- Olha outro! Acreditas nessa, pá? O Saramago não morre! É como o Elvis...
- ...Ou os Tokio Hotel...
- És parvo ou quê?! Não compares peidos com marmelos!
- Está bem, pronto. Mas também não é preciso ofender!
- Ofender?! Se estou a ofender alguém é o Elvis, que não é um marmelo qualquer!
- Pronto, está bem. Dá-me aí a chave do carro para eu ir buscar a prancha. Quero ir surfar.
- Não vais surfar coisa nenhuma. Só por causa dessa dos Tokio Hotel, agora vais mas é para casa e não sais de lá enquanto não leres o “Caim” e o “Memorial do Convento”.
- Estás a falar a sério?!
- Nunca falei tão a sério! Tens de aprender a lutar pela vida e a questionar o dogma e o mundo capitalista! A partir de hoje, não te compro mais roupa de marca!
- Ai é?! E o que é que eu visto?!
- Desculpem lá, mas, em vez de estarem para aí com essa conversa, que não leva a lado nenhum, porque é que não vão surfar? Eu tiro-vos umas fotos!
- Tiras umas fotos, tu?! A veres ondas na Berlenga, deves tirar boas fotos!... Dá cá a máquina, vá, antes que me dês cabo dela.
- Espera, deixa-me só fotografar a onda daquele bodyborder! Eh, pá, grande manobra!
- O QUÊÊÊÊÊÊ!!! DÁ CÁ JÁ A MÁQUINA!!! COMO TE ATREVES A DESPERDIÇAR-ME A CARGA DA BATERIA COM UM BODYBORDER!!!
- Calma, tio, também não é preciso enervares-te...
- UMA PORRA! CAÍSTE BEM FUNDO! FICAS JÁ A SABER QUE SÓ VOLTAS A PEGAR NA MÁQUINA QUANDO LERES O “ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA” E O “LEVANTADO DO CHÃO”!

terça-feira, 15 de junho de 2010

drogba, canja e um cheiro a "toca"

Entre a panóplia de fotos que resultaram do fim-de-semana comprido, escolhi três. Outras havia. Algumas, até, revisteiras. De surfistas que nem conheço. Mas os surfistas que mais admiro são aqueles de quem sei um pouco mais que o nome. São aqueles que cumprimento com uma certa cumplicidade que vai um pouco para além do elemento líquido.
O primeiro clichê é do nosso Quim Moura, que, quando se põe em cima duma onda, trata-a como se o mundo fosse acabar naquele instante. No caso vertente, talvez se vingasse dum tal Drogba, que o dropinara infamemente na direita anterior (lembras-te, "Corvo"? – eu vi tudo lá de cima, através da Canon. Mando-te as provas por e-mail, caso queiras meter o cão em tribunal).
O segundo momento é do nosso Rui Lopes, que, para apanhá-lo dentro de água, é preciso o céu cair-nos em cima. Ou porque vai comer uma canja; ou porque vai passear o cão; ou porque a avó faz anos; ou porque vai ali e já vem; ou porque ‘tá crowd; ou porque agora ‘tá a vazar; ou porque "Apetecia-me ‘tar era nas Maldivas...”. Bom, no meio das cem cabeças que, no último sábado, enxameavam o Cantinho, lá consegui miraculosamente descobrir a dele (cuidado com essas manobras, puto, não vás vomitar o raio da canja!).
Por último, um bom exemplo de como tirar o melhor partido da maré totalmente vazia (que todos desprezam) e dos close outs: o nosso “Isca”, vingando, no Cantinho, ao final da tarde, com um belo drop a cheirar a “toca”, o dia de trabalho de sexta-feira (a ponte foi só para alguns... Mas certas ondas também... E com muito estilo!).

terça-feira, 8 de junho de 2010

à procura de nemo

Há dias encontrei este aquário com estes dois espécimes. Alguém sabe se algum deles é o Nemo?

segunda-feira, 7 de junho de 2010

da pesada

- Hey, Alex, tu dropinar mim?!
- Oh, iú are dere, David?
- Eu estar aqui, sim, Alex, e tu fingir não ver mim!
- Iú are dere rili, David?
- Hey, Alex! Não brincar! Não gozar mim!
- Oh, iú are rili dere, David!
- Tu grand’ malandro, Alex! Eu doer costas e barriga e tu aproveitar para dropinar mim!
- Camone, David! Ai dont dropineite frends!
- O.K. Tu esperar só 10 minutos e eu fazer take-off perfeito e ultrapassar tu!
- Du iú know de song of Jorge Palma “Deixa-me Rir”, David?
- Não gozar mim, Alex! Eu comer e beber muito no teu rulote! Meu barriga pesar um tonelada! Eu não sentir muito bem...
- Uót?! Iú dont mine iú ont to vomiteite de fud ai meide to iú!
- Yes, Alex, eu precisar vomitar e fazer cocó!
- Aguenteite iorself a litle bit more. Dont du shit intsaide de uótar. Give mi ior hend. Ai uil teike iú rapidly tu de bassrrum.
- Oh, faster, faster, Alex! Eu não aguentar mais! Eu fazer diarreia no wetsuit!
- No, David, No! Not íare, méne! It is not ecologic!
- PPPPRRRRRRR... TTTTRRRRAAAACCCC... PRRRRRRRRRR... TTRRAAACC... TRRRAAACCCCC...
- Oh, mai gode! Iú are a pig! Ai uil never give iú sup of de stone eni more!...

Fotos: Joana Ralha

terça-feira, 1 de junho de 2010

people

1. Os amigos são para as ocasiões
O nosso Pedro “Oli” voltou ao Cantinho no último fim-de-semana, onde já não aparecia, pelo menos que eu o constatasse, desde a última celebração da República.
Talvez por se encontrar notoriamente mais elegante (parece que, agora, só come alfaces e bebe Ice Tea), não lhe apeteceu alombar, desde a Costa da Caparica, até à Capital da Onda, com o seu clássico bacalhau à Tom Blake, que pesa cem quilos.
Quem acabou por pagar as favas foi o bom do Saraiva, que numa espécie de serviço personalizado ao domicílio, lá apareceu no seu Mercedes magnânimo, de cuja bagageira a cheirar a wax fez emergir o brinquedinho que faltava ao Oli para ser um pouco mais feliz naquele dia. Os amigos são para as ocasiões...


2. Filho de peixe...
Single fins e uma carrinha “pão-de-forma”: se forem à página 75 da “História do Surf em Portugal”, elas estão lá. Nada que espante, dado o tema do livro. Mas não é de objectos que vos venho falar, sob o risco de contradizer o título principal deste post. Sugiro, portanto, que espreitem as caras a preto e branco de quem lá aparece e exercitem o vosso talento de detectives para descobrirem qual daquelas criaturas viu a sua jovem cabeça transformar-se na impecável “pista de aterragem” do nosso amigo Alberto Reis.
Entre um momento e o outro, passaram, seguramente, milhares de aviões. O que não passou foi a febre do mar. Essa doença benigna de que o nosso herói da página 75 já tem herdeiro, a comprovar pelo abraço cúmplice, depois dumas ondas em família. Filho de peixe...


3. Afinal, quem é a noiva?
Imagina dez raparigas, que não conheces de lado nenhum, a comemorarem uma despedida de solteira num surf camp. Imagina que és o Sérgio “Isca” Ramalho e que vais lá estar. Que comes gambas e mexilhões na mesa ao lado, utilizando os dedos todos, como um bárbaro, enquanto as moças, afinal muito bem educadas e sem sinais de devassidão, limpam aristocraticamente os lábios aos guardanapos e falam baixinho como as freiras.
«Boa noite, amigas! Vamos lá a ver uma coisa: afinal, quem é a noiva? Ah, és tu! Então, ‘bora lá fazer um brinde. Toma lá este copo de vinho e bebe isso tudo duma assentada quando eu disser. Um, dois, três: viva a noiva!» (glu, glu, glu glu...).
Findo o discurso, maior que o sermão de Santo António aos peixes, e terminada a garrafa de vinho que só o orador bebeu, as moças foram fazer óó. Nunca se viu um homem gastar tanto latim para nada.


4. Mike
Se Peniche é um local famigerado pela abundância de peixe, também o é pelos bifes, os quais, pelo menos desde o início dos anos 60’, partilham com a fauna local o mar que envolve a península, desde o Medão ao Baleal, passando pelo Cabo Carvoeiro.
A sua presença deixou, por isso, de constituir uma novidade há já muito tempo. E, apesar de nos deixarmos, muitas vezes, incomodar com uma certa ocupação territorial costeira, o que nos advém, talvez, duma crescente falta de espaço, não daríamos, certamente, preferência a uma Capital da Onda orgulhosamente só, até porque, se fechássemos a porta do quintal, a cidade assim promovida nem sequer existiria.
Mike arribou a meio da semana, vindo de Bristol (Inglaterra), com três pranchas e um saxofone. Conheci-o num jantar imprevisível, depois de o ter dropinado três vezes naquela tarde de sexta-feira, sem saber que se tratava da mesma pessoa. Constatei esse facto na manhã do dia seguinte, quando o vi aparecer no Cantinho com uma bela twin fin azul, descaradamente familiar...
Por infortúnio, quis o destino, e os amigos do alheio, que regressasse sem ela à Grã-Bretanha, após um descuido fugaz. Para compensar, levou na bagagem a nossa amizade e vontade de sobra para voltar um dia à Capital da Onda. Aloha, Mike! Nice to meet you!